Capitalismo e Psicologia: parceiros desde o início

O capitalismo é um modelo econômico que tem como características a propriedade privada, a concentração dos meios de produção e a transformação da força de trabalho em mercadoria. Esta organização das relações de produção, trabalho e consumo surge no início da Idade Moderna e se amplia de maneira mais intensa após a Revolução Industrial, entre os séculos XVIII e XIX.

Segundo Foucault, do século XIX em diante, o poder passou a atuar por meio de diversos micropoderes, visando exercer um controle apurado sobre o corpo das pessoas e suas atividades, controlando seu ordenamento espacial, o tempo para cada tarefa e a organização de grupos de pessoas. Esses controles foram exercidos por meio de diversos agentes disciplinares.

Esse novo modelo econômico promoveu também mudanças arquitetônicas, com novos espaços para o trabalho, para a moradia, a divisão de espaço público e privado, bem como os espaços de conexões entre ambos. A economia capitalista trouxe novas relações de poder e de exploração do trabalho, dos recursos naturais, dos espaços colonizados e das subjetividades.

A psicologia enquanto disciplina científica se iniciou na Alemanha no final do século XIX, e se desenvolveu na Europa e nos Estados Unidos, no contexto da industrialização capitalista, período que estabelece um novo modelo de vida e de relações - a família nuclear, o trabalho assalariado, e o surgimento da noção de normal em contraposição aos dissidentes e estranhos.

Todas as teorias psicológicas são elaboradas num tempo e contexto específico, não existe saber neutro. O conhecimento científico é resultado de uma produção de pesquisadores situados no mundo, num tempo histórico e pautados em valores específicos. Por isso, a produção de conhecimentos é também uma prática política, que envolve interesses e relações de poder.

Noções como "saúde mental", "desenvolvimento adequado" ou "família estruturada" surgem juntamente com um novo modelo de vida, de relação com o trabalho e com a família, evidenciando tal modelo como "natural", "adequado" e "saudável". As teorias em psicologia foram desenvolvidas de mãos dadas e servindo de suporte ao capitalismo industrial emergente.

Enquanto a polícia era utilizada para lidar com a agitação política, greves e manifestações, os psicólogos passaram a ser utilizados para os casos de indisposição ou incapacidade para o trabalho ou a convivência em grupo, a psicologia se desenvolveu construindo conhecimentos atrelada ao capitalismo, visando o constante controle e previsão dos comportamentos.

A psicologia experimental, que consiste na psicologia produzida em laboratório por Willhelm Wundt, no final do século XIX, que esteve desde seu início separada do mundo real, colocando o psicólogo no papel de cientista e as pessoas como objetos de estudo, separando o pesquisador dos sujeitos pesquisados, convertendo as pessoas em coisas, observando os sujeitos em objetos a serem mensurados e manipulados.

"Existiam duas pressões sobre os psicólogos no início do século XX: primeiro, eles tinham que mostrar que seu conhecimento poderia ser reivindicado enquanto fundamentado em evidências (...); em segundo lugar, (...) eles deveriam apresentar um tipo de conhecimento que conseguiria predizer o comportamento."
(Ian Parker em 'Revolução na Psicologia')

Mensurar, prever e controlar os comportamentos dos indivíduos passou a ser uma necessidade a ser exercida desde o nascimento até a morte de cada pessoa. O interesse da psicologia, desde seu início, foi direcionado para identificar e tratar (enquanto sinônimo de "ajustar") os diferentes e anormais, aqueles que eram inapropriados para o trabalho e que, por isso, precisavam ser "regulados".

Deste modo, a psicologia se desenvolveu aliada ao capitalismo, inclusive estabelecendo suas noções de "normalidade" e "saúde mental", conforme a disposição ao trabalho e para a convivência em grupo, de modo a servir aos interesses de um novo modelo econômico, que transformou toda a disposição social e as relações entre as pessoas, inclusive a noção de saudável e doentio psiquicamente.

Por Bruno Carrasco.

Referências:
CATANI, Altânio M. O que é Capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1986.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014.
PARKER, Ian. Revolução na Psicologia: da alienação à emancipação. Campinas, SP: Alínea, 2014.

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