Operários, Tarsila do Amaral, 1933 |
O senso comum costuma simplificar a compreensão dos comportamentos humanos, atribuindo a eles causas simplistas e muitas vezes fisiológicas, como fatores biológicos ou hormonais. Como se os comportamentos de uma pessoa fossem resultantes apenas de questões fisiológicas, deixando de considerar outras condições.
Embora a fisiologia tenha um papel importante, reduzir os comportamentos a causas fisiológicas é uma consideração muito simplista. O comportamento humano é um fenômeno multifacetado e complexo, onde a fisiologia é apenas uma das variáveis entre tantas outras, geralmente mais influentes, como as condições históricas, o contexto social, as relações familiares e a subjetividade.
Os comportamentos humanos não podem entendidos isolados do contexto histórico em que a pessoa está inserida. Cada época estabelece e possibilita certos entendimentos, normas, valores, práticas e disposições que influenciam as ações e escolhas individuais. A dimensão histórica contextualiza e direciona as interações sociais, os modos de se relacionar, as atividades e hábitos das pessoas.
Por exemplo, o comportamento esperado de um indivíduo em relação ao trabalho no século XXI é profundamente configurado pelo capitalismo neoliberal, caracterizado pela competitividade, receio da demissão e por transformações tecnológicas. Na Idade Média, a relação com o trabalho não tinha nenhuma relação com competitividade ou com o desempenho do trabalhador.
Compreender os comportamentos de uma pessoa demanda também olhar para o contexto social em que a pessoa se relaciona. A sociedade é uma das mais amplas influências dos comportamentos humanos. Normas sociais, papéis e estruturas de poder exercem uma influência profunda sobre o modo como as pessoas agem e interagem entre si.
Diferenças comportamentais entre gêneros ou classes sociais são frequentemente interpretadas como naturais, quando na realidade são resultantes de dinâmicas sociais e culturais. Pierre Bourdieu destaca como as disposições culturais internalizadas orientam nossas práticas e preferências, evidenciando a importância da dimensão social nos comportamentos e emoções.
As interações familiares também desempenham um papel crucial nos comportamentos de um indivíduo. A família é o primeiro espaço de socialização, onde os indivíduos aprendem valores, normas e modos de se relacionar com os outros e com o mundo. Questões como dinâmicas de afeto, maneiras de lidar com conflitos e de se comunicar influenciam diretamente os comportamentos de uma pessoa.
Uma criança que cresce num ambiente familiar violento ou agressivo pode desenvolver padrões de comportamento defensivos e agressivos, na maioria aprendidos com seus familiares mais próximos. Esses comportamentos não podem ser entendidos unicamente por meio de fatores biológicos ou hormonais.
Além das condições históricas e sociais, temos também a subjetividade. Cada indivíduo percebe e interpreta o mundo de maneira única, com base em suas experiências, desejos, medos e aspirações. A subjetividade não é um elemento secundário, mas uma dimensão estruturante que confere um significado particular às ações humanas.
Embora a fisiologia não deva ser descartada, é preciso situá-la num contexto mais amplo. Os processos biológicos fornecem condições para a certos comportamentos, mas não determinam como serão as ações. Uma pessoa pode apresentar alterações fisiológicas devido ao estresse, mas o modo como reage a condições de estresse está relacionado com os modelos familiares, históricos e sociais.
As condições históricas, sociais e familiares desempenham um papel central nos comportamentos, atitudes e escolhas de uma pessoa, influenciando profundamente a experiência individual. Compreender o comportamento humano requer uma abordagem ampla, complexa e integrativa, reconhecendo a interação entre fatores fisiológicos, históricos, sociais, familiares e subjetivos.
Referências:
BOCK, A. M. B.; GONÇALVES, M. de L. T.; FURTADO, O. Psicologia Sócio-Histórica: uma perspectiva crítica em psicologia. São Paulo: Cortez, 2001.
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OLIVEIRA, Marta Kohl de. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento: um processo sócio-histórico. São Paulo: Scipione, 2001.