Um terapeuta anarquista não se coloca numa posição de poder sobre a pessoa em atendimento, seja em relação às suas ideias, emoções ou modos de vida. Não atua como autoridade, nem exerce qualquer forma de controle. Sua atividade consiste em colaborar para que cada um se perceba e tome suas próprias decisões sobre a vida.
Um terapeuta anarquista estabelece relações libertárias com quem busca terapia. Seu trabalho visa possibilitar que as pessoas façam escolhas de acordo com suas avaliações e perspectivas, por meio de ações diretas, levando em consideração os outros e os espaços em que estão inseridas.
Um terapeuta anarquista não avalia nem submete a pessoa a critérios diagnósticos ou morais, como “certo” ou “errado”, “adequado” ou “inadequado”, “saudável” ou “doentio”, pois entende que apenas a pessoa pode avaliar a si mesma por seus critérios. Compreende que as avaliações socialmente estabelecidas são apenas convenções que podem ou não nos servir.
Um terapeuta anarquista entende que as relações podem ser estabelecidas por meio do diálogo e respeito mútuos, sem a necessidade de regras prévias de funcionamento. As pessoas envolvidas numa relação podem estabelecer suas próprias regras e alterar quando necessário.
Um terapeuta anarquista estabelece uma relação horizontal com quem busca terapia, sem autoridade, mas com respeito e consideração, sem hierarquias ou superioridade, possibilitando uma aproximação mais genuína e respeitosa.
Um terapeuta anarquista acredita na possibilidade de reagir de diferentes maneiras diante de conflitos, reconhecendo também a importância de se proteger de situações perniciosas. Entende que alguns conflitos podem ser resolvidos pelo diálogo, mas nem todos se resolvem — nesses casos, o distanciamento pode ser uma saída.
Um terapeuta anarquista não direciona a pessoa num tratamento, não propõe nem traça caminhos sobre seus modos de vida. Em vez disso, se atenta às suas experiências, percepções e modos de vida, propondo reflexões e acompanhando suas experimentações consigo mesma, ampliando as possibilidades de pensamento e ação.
Um terapeuta anarquista entende que o sofrimento emocional não se transforma por conta própria, pois não é algo “somente” da pessoa, mas algo que acontece sempre em relação a um contexto e a outras pessoas. Portanto, só pode ser transformado na relação, na ação prática, e não apenas na reflexão. A reflexão é fundamental como um ensaio para a ação, mas não há mudança sem ação efetiva.
Um terapeuta anarquista não determina quando se inicia o trabalho terapêutico, nem sua frequência, sua duração ou mesmo quando se encerra. Quem decide o momento de iniciar a terapia é a pessoa que busca terapia, sendo esta quem escolhe sua frequência e seu término. O terapeuta anarquista apenas acompanha a pessoa durante esse processo, em seu tempo e ritmo.
Um terapeuta anarquista não estabelece metas para o trabalho terapêutico, mas auxilia a pessoa a perceber seus movimentos e desejos, de modo a colaborar para seguir na direção de seus próprios caminhos e interesses. O terapeuta anarquista não estabelece um programa de terapia, pois entende que a vida é um processo, e que cada pessoa segue seus próprios percursos.
Um terapeuta anarquista não tem receio de compartilhar seus conhecimentos e experiências, pois entende que aprendemos mutuamente, e que conhecer perspectivas distintas de pensamento e de vida pode ser libertário, possibilitando uma ampliação de nossos horizontes existenciais.
Um terapeuta anarquista não se coloca hierarquicamente superior à pessoa em atendimento, mas entende que há uma diferença entre as disposições (a do terapeuta e da pessoa atendida), onde cada um ocupa um lugar específico durante o trabalho terapêutico. A relação entre terapeuta e pessoa atendida é baseada na liberdade e consideração.
Um terapeuta anarquista não procura uma verdade sobre a pessoa, não busca decifrar sua mente ou suas emoções, muito menos traçar um perfil sobre a pessoa, mas tenta captar as diferenças, os detalhes, as transformações, os processos e as singularidades em movimento. Se interessa pelo transitório, pelo efêmero, o fragmentado e o intempestivo.
Um terapeuta anarquista nos convida a pensar, agir e nos autogerir livremente, em favor de nossa autonomia afetiva, refletindo outras maneiras possíveis de lidar com nossos conflitos e dilemas. Reconhece que cada indivíduo escolhe seu caminho e toma suas decisões, considerando seus distintos modos de ser e se fazer.


